Artigo compartilhado do BLOG DO ORLANDO TAMBOSI, de 9 de
março de 2021
Como a decisão de Fachin sobre Lula afeta a sua vida
A decisão de Fachin nos afeta naquilo que temos de mais
divino: a capacidade de distinguir o certo e o errado e a nossa esperança.
Paulo Polzonoff Jr. para a Gazeta do Povo:
Por causa da decisão de Fachin sobre Lula, passei a tarde de
ontem recebendo mensagens de amigos. Umas com mais, outras com menos pontos de
exclamação. Todas cheias de indignação, frustração, revolta impotente e
dúvidas. Muitas dúvidas. A todas eu tentei reagir com algum humor, repetindo o
velho adágio do “isso também passará”. Até que recebi a ligação do meu pai.
Meu pai é um homem simples. Um homem extraordinariamente
comum que viveu para dar uma vida melhor do que teve aos filhos. Ele é também
um homem íntegro, que nunca suportou desonestidade e mentira. Ao telefone, ele,
que nunca fala palavrão, soltou um ou dois efedepês para se referir aos
envolvidos. E concluiu com um lamento: “Não vou viver para ver o Brasil ser um
país melhor”.
Ao ouvir aquilo, eu, que estava no meio de um texto
pretensamente leve e engraçado sobre a “fachinada” do STF, percebi que essa era
uma daquelas raras situações em que o riso não ajuda em nada. Apesar de fazer
parte de um teatro distante, com personagens que parecem semideuses,
interpretados por atores canastrões num cenário cheio de pompa vazia, a decisão
de anular as sentenças de Lula na Lava Jato afeta, sim, a vida das pessoas
honestas, íntegras e comuns.
Lei Natural
E afeta naquilo que temos de mais divino: a capacidade de
distinguir o certo e o errado, o bem e o mal. Num processo que já dura anos, os
juízes, que deveriam expressar a consciência moral coletiva da sociedade,
abandonaram esse dever nobre para prestar mesuras à política mais rasteira,
para se subjugar a um Estado sem alma e sem moral. Fachin e seus colegas há
muito abandonaram a submissão à Lei Natural para se tornarem escravos de
Maquiavel.
Não é de hoje que o STF agride nosso já combalido senso de
justiça. Já no julgamento do Mensalão, há remotos 9 anos, pairava no ar a
sensação de que nossa Corte tinha interesses outros que não tentar apaziguar as
relações entre os homens públicos e a verdade. Uma sensação que, nos últimos
anos, com Inquérito do Fim do Mundo e afirmações de que o STF deveria agir como
“editor da sociedade”, foi se intensificando.
Hoje estamos à mercê não de Juízes, no sentido até bíblico
do termo. Estamos à mercê de técnicos do direito, todos positivistas
acreditando piamente que, se não são deuses, chegam perto disso. Na base da
canetada monocrática, eles são capazes de moldar a realidade de forma a
adequá-la a seus caprichos. Nós, homens comuns, não somos súditos; somos peões
numa experiência jurídica que parece ter como objetivo provar que a Letra é
maior do que o Verbo. Não é.
A decisão de Fachin também abala nossa esperança. Esperança
que, mais do que uma palavra a enfeitar agendas de adolescentes, é aquilo que
nos impulsiona à virtude. Meu pai viveu com a esperança de ver seus filhos e
netos vivendo num país melhor do que o Brasil em que ele nasceu. Não um país
perfeito, mas melhor. Mais próspero, e mais pacífico. Um país recompensasse o
trabalho e repreendesse os vícios.
É a esperança, mesmo que a ela possamos dar nomes diversos, o que nos move a acordar todos os dias. E, no meu caso, vir aqui e escrever este texto que, se é incapaz de acalmar o leitor mais exaltado, talvez ao menos lhe dê uma perspectiva menos sombria (e menos pragmática) sobre tudo o que acontece naquele paraíso de tecnocratas desalmados que é Brasília.
Impotentes diante de um poder que parece infinito e de uma
justiça que há muito abandonou a lógica mais elementar, sem um ou vários
líderes capazes de nos devolver verdadeiramente a esperança de ver a ordem
reinstaurada e impossibilitados até mesmo de criticar o onipotente e impiedoso
STF, o que nos resta? Cada um há de encontrar sua saída. Eu vou de paciência e,
quando for a hora, de riso.
Texto e imagem reproduzidos do blog: otambosi.blogspot.com
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