Artigo compartilhado do BLOG DO ORLANDO TAMBOSI, de 11 de outubro de 2024
Um país em busca de novos líderes
Quem são os políticos que se destacaram nas eleições municipais. Duda Teixeira para a revista Crusoé:
O primeiro turno das eleições municipais do domingo, 6, deram uma lufada de ar fresco na política nacional, hoje dominada por Lula e Jair Bolsonaro. Os dois estão há décadas alternando-se entre palanques e mandatos (o petista concorreu à Presidência pela primeira vez em 1989, ano em que Bolsonaro estreou como vereador no Rio de Janeiro). Nesse tempo, eles não apenas engessaram o debate público como impediram que outros nomes crescessem ao redor.
A renovação anunciada na última eleição pode se dar tanto na esquerda quanto na direita, mas elas devem ocorrer em velocidades diferentes. Na esquerda, a mudança virá a passos de tartaruga. O presidente Lula ainda submete os quadros dos partidos aliados à sua vontade e tem pretensões claras de se lançar à Presidência novamente em 2026. “Lula não deu mostras até agora de que abrirá espaço para mais alguém na esquerda. O ministro da Fazenda Fernando Haddad, por exemplo, já foi considerado como um possível sucessor, mas não terá chance daqui a dois anos. A esquerda então terá de esperar 2030 para uma renovação”, diz o cientista político Bruno Bolognesi, professor da Universidade Federal do Paraná.
Essa opinião é compartilhada por Gilberto Kassab, o líder do PSD, partido que mais conseguiu prefeitos nesta eleição. “A esquerda está com dificuldade de se renovar e está refém da figura de Lula”, disse Kassab em entrevista nesta semana.
Na direita, a corrida para ganhar visibilidade em 2026 já começou. Como Jair Bolsonaro foi declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral, alguns postulantes já declaram abertamente que gostariam de tentar a eleição presidencial daqui a dois. Outros se movem calados, mas com esse objetivo em mente.
Crusoé fez um levantamento dos nomes que ganharam força nas últimas eleições municipais e têm boas chances de ganhar projeção nacional no futuro, tanto à esquerda quanto à direita. Como brinde, no final, há ainda um breve perfil de Edinho Silva, o homem que estava incumbindo de renovar o PT, mas que não conseguiu fazer sua sucessora na cidade de Araraquara, interior de São Paulo.
Pablo Marçal
Sem tempo de televisão, concorrendo por um partido inexpressivo, o PRTB, e sem usar recursos públicos, o influenciador amealhou 28,14% dos votos na maior cidade do país — um feito e tanto. A audiência que os debates da capital paulista registaram por todo o Brasil se deveu principalmente a ele. Suas contas nas redes sociais impressionam pelo número de seguidores. Só no Instagram ele chegou a ter 13 milhões de pessoas. É uma presença digital que abrange todo o território nacional e que traz um inegável capital político. “Ele manipulou a eleição como quis, conhece formas inovadoras de organização e comunicação e mostrou para Bolsonaro que suas alianças com o centro podem deixar um volume grande de eleitores à disposição de outros candidatos da direita. Foi o maior nome da eleição em termos de barulho e eventos dignos de análise”, diz o cientista político Leonardo Barreto, sócio da consultoria Think Policy e colunista de Crusoé.
Embora não tenha ido para o segundo turno (por 56 mil votos), Marçal está sendo requisitado para fazer campanha para candidatos bolsonaristas em outras cidades do país. Ele assim, poderá se tornar uma linha acessória desse movimento, capaz de motivar os eleitores mais descontentes com a política tradicional, com a esquerda e com o PT. Caso não se torne inelegível por processos na Justiça, ele poderá contestar a liderança de Jair Bolsonaro na direita e lançar-se para a Presidência em 2026. Dentro do bolsonarismo, fala-se de uma possível chapa com o deputado federal Nikolas Ferreira, de Minas Gerais. A aproximação entre os dois têm irritado o entorno de Bolsonaro.
João Campos
O prefeito do Recife, de apenas 30 anos, obteve uma reeleição no primeiro turno com uma votação invejável: 78%. Foi a primeira vez em que um prefeito obteve mais de 725 mil votos na cidade com 980 mil eleitores. Ao governar uma das maiores cidades do Nordeste, João Campos fura a bolha da esquerda lulista. Ainda que tenha sido apoiado pelo presidente, ele não baseou sua campanha nisso. Também é um exímio usuário das redes sociais, como o TikTok.
O plano de João Campos é buscar o governo de Pernambuco em 2026 para, quem sabe, partir para a Presidência da República em 2030. “Os líderes se formam nos embates políticos, e João está se saindo muito bem. O partido aposta alto no seu desenvolvimento e na sua capacidade de crescimento, para que ele possa se tornar uma alternativa progressista ao nosso país”, disse o presidente do PSB, Carlos Siqueira, a Crusoé.
Tarcísio de Freitas
O governador foi mais determinante que Jair Bolsonaro na eleição de diversos candidatos municipais no estado de São Paulo. Seu partido, o Republicanos, quadruplicou o número de prefeitos no estado, de 22 para 80. Tarcísio também acertou ao apoiar o prefeito da capital, Ricardo Nunes. Ele ajudou o prefeito a montar a sua coligação e anunciou o vice da chapa. Nunes, que sempre teve um apoio vacilante de Bolsonaro, é o favorito para o segundo turno, dia 27. “O Tarcísio não era candidato, mas foi um dos vencedores do primeiro turno porque foi testado duramente quando a candidatura do Nunes ameaçou fazer água. O governador foi responsável direto pela presença do Nunes no segundo turno. Ganhou respeito dos partidos e capacidade de construção de alianças”, diz o cientista político Leonardo Barreto.
Com Jair Bolsonaro inelegível, Tarcísio aparece como o político mais bem posicionado para atrair os votos da direita na próxima eleição presidencial, tendo ainda para si a máquina paulista à disposição. Gilberto Kassab, o líder do PSD, partido que integra o governo Tarcísio, disse que acompanharia o governador em voos maiores. “Meu projeto é Tarcísio, sendo Tarcísio, eu vou estar alinhado com o projeto que seja compatível com o projeto do Tarcísio, seja ele governador ou presidente”, afirmou Kassab em entrevista. O bom resultado do governador em sua estreia como cabo eleitoral mostra que Tarcísio tem luz própria e não precisa se curvar para Bolsonaro, mudando do Republicanos para o PL.
Tabata Amaral
Deputada federal em dois mandatos, Tabata saiu das eleições de São Paulo maior do que entrou, com 605 mil votos. Reteve uma base de 10% do eleitorado na capital paulista, apesar da campanha de voto útil para Guilherme Boulos, do Psol. Apesar de ser da esquerda, segue pautas conservadoras. E contra a legalização do aborto, o que lhe dá penetração entre evangélicos. Também é crítica da ditadura da Venezuela, um avanço considerável em relação à velha esquerda. Apesar de ter ficado na quarta colocação, Tabata ganhou projeção nacional ao criticar a agressividade dos candidatos homens e ao se contrapor a Pablo Marçal e Guilherme Boulos nos debates da televisão.
Tabata poderia disputar o governo de São Paulo em 2026, mas essa é considerada uma aposta de risco, principalmente diante da possibilidade de um segundo mandato de Tarcísio de Freitas. Por isso, a tendência é que ela mantenha o mandato de deputada federal, com possibilidade de voltar a disputar a prefeitura de São Paulo em 2028. E, aí sim, traçar voos maiores em 2030, quando estará com 36 anos. Com João Campos, seu namorado, o casal do PSB é visto por muitos como o futuro da esquerda no Brasil, possivelmente substituindo o PT.
Cristina Graeml
A jornalista era desconhecida do grande público em Curitiba e saiu por uma legenda nanica, o PMB, Partido da Mulher Brasileira, PMB. Não teve espaço na televisão, fundo eleitoral e não foi convidada para os debates. Destacou-se em entrevistas e ganhou apoio de figuras nacionais da direita, como Pablo Marçal. Jair Bolsonaro autorizou o uso de uma foto sua na campanha, apesar de o ex-presidente apoiar formalmente seu rival no segundo turno, Eduardo Pimentel, do PSD. De 5% no início da campanha, ela terminou com 31% dos votos.
Cristina ainda tem um longo caminho pela frente. Em primeiro lugar, ela ainda terá de disputar o segundo turno com um candidato de direita, Eduardo Pimentel. Outro obstáculo é a reduzida importância de Curitiba na política nacional. “Cristina está em uma onda de crescimento, mas há dúvidas sobre quanto ela vai conseguir segurar essa tendência. Além disso, Curitiba e o Paraná não costumam exportar políticos para Brasília”, diz o cientista político Bruno Bolognesi, professor da Universidade Federal do Paraná.
João Henrique Caldas (JHC)
O prefeito de Maceió, João Henrique Caldas, conhecido pela sigla JHC, obteve a reeleição na capital alagoana com 83% dos votos válidos. Foi um dos maiores percentuais em todo o Brasil e a maior votação da história do município. Membro do PL, o partido de Bolsonaro, ele firmou-se numa região conhecida por ser um "cinturão vermelho", onde prevalecem as legendas de esquerda. Em um estado historicamente dominado pelas famílias Calheiros e Lira, JHC quebrou a lógica binária e ainda se garantiu por mais quatro anos. Ele esnobou o apoio dos Calheiros e, ao se vincular ao senador Rodrigo Cunha (União), abriu uma terceira frente no estado. Durante sua primeira gestão, JHC foi um craque no uso das redes sociais, a ponto de ganhar a alcunha de “prefeito do Instagram”.
JHC é apontado como um possível nome do PL para disputar o Senado em 2026, provavelmente disputando com os alagoanos Arthur Lira e Renan Calheiros. Apontado como um político de uma direita mais moderada, JHC pode ganhar espaço entre eleitores nordestinos que fogem da polarização entre Lula e Bolsonaro.
Amom Mandel
Este jovem político de 23 anos chamou a atenção dos brasileiros por ter se declarado como portador do transtorno espectro autista. Mas, ao contrário da esquerda, ele não faz o papel de coitadinho. Em 2020, um ano após iniciar seu curto de Direito na Universidade Federal do Amazonas (UFAM), ele conquistou seu primeiro mandato como vereador. Dois anos depois, foi o deputado federal mais votado do Amazonas, com 288 mil votos.
Nas eleições de Manaus de 2024, Amom tornou-se o mais jovem candidato a prefeito de capital. Ele concorreu pela federação PSDB-Cidadania, sem muita estrutura. Conseguiu 210 mil votos dos manauaras, ficando atrás apenas do prefeito Davi Almeida (Avante) e de Capitão Alberto Neto (PL). Com 19% dos votos, Amom não foi para o segundo turno, mas é apontado como um possível sucessor do senador Omar Aziz, do PSD do Amazonas.
Edinho Silva (brinde)
O prefeito de Araraquara tinha sido incumbido de renovar o Partido dos Trabalhadores, o PT. Ele foi escolhido por Lula para substituir Gleisi Hoffmann no comando da sigla e era visto como alguém capaz de se aproximar de outros partidos. Edinho também era um símbolo de resistência, pois conseguiu a reeleição em 2020, em uma região que se inclinou fortemente para o bolsonarismo. Nesta eleição de 2024, contudo, ele não conseguiu fazer a sua sucessora, Eliana Honain.
O vencedor em Araraquara foi o médico Dr. Lapena, do PL. Em conversa com Crusoé, o futuro prefeito falou sobre o papel que Edinho Silva poderá ter na reestruturação do partido rival. “Edinho Silva é tratado por alguns veículos da imprensa como se fosse uma novidade, mas não é nada disso. Ele já foi presidente do PT estadual, deputado estadual, foi da Secretaria de Comunicação da Presidência no governo de Dilma Rousseff. O problema é que o PT não tem mais ninguém. A maioria dos seus quadros está desgastada ou enfrentou problemas diversos, como corrupção. A derrota em Araraquara mostra isso. Edinho só é visto como esperança pelo partido porque não há mais ninguém novo para assumir essa função”, diz o Dr. Lapena.
Texto e imagem reproduzidos do blog: otambosi blogspot com
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