terça-feira, 12 de agosto de 2025

'Em Gaza, tragédia dentro da tragédia', por Fernando Gabeira

Artigo compartilhado do site do GABEIRA, de 12 de agosto de 2025

Em Gaza, tragédia dentro da tragédia
Por Fernando Gabeira (in blog)

Corações partidos diante de mais de 61 mil mortes e 146 mil feridos encontram-se com uma nova tragédia em Gaza: Israel decidiu ocupar militarmente a região. O principal alvo é a cidade de Gaza, ao norte da Faixa. Mais de 1 milhão de pessoas terão de deixar suas casas de agora até 7 de outubro. Para onde vão, como comerão?

Existem apenas quatro pontos de distribuição de comida. Cerca de 1.400 palestinos foram fuzilados perto desses postos. Apenas 1,5% das terras agrícolas não foram destruídas. Só a ajuda de fora pode conter a fome.

Netanyahu chegou a negar essa fome, mas foi contestado pelo próprio Trump. É impossível ignorar a imagem das crianças esquálidas. O que acontecerá nas próximas semanas não só pode acentuar o isolamento internacional de Israel, como reacender uma importante tradição local: o intenso debate sobre o futuro do país.

Alguns sinais são públicos: o chefe do Estado-Maior do Exército, Eyal Zamir, já expressou sua oposição às novas manobras militares:

— Continuaremos a expressar nossas posições sem medo, de forma pragmática, independente e profissional.

A divergência está aberta. A posição do Exército é cercar as zonas onde podem estar os reféns, enfraquecer o Hamas e libertá-los. O Centro Moshe Dayan de Estudos do Oriente Médio e da África parece também ter a compreensão de que é impossível, ao mesmo tempo, destruir o Hamas e libertar os reféns. O próprio Clausewitz, o grande teórico da guerra, não recomendaria um claro desalinho entre objetivo estratégico e ação militar.

Mas a coligação de direita insiste nessa aventura, submetendo as forças militares já exaustas a uma guerra de guerrilhas nos escombros da cidade. Israel já perdeu meia centena de soldados em Gaza. Dezesseis se suicidaram. Enquanto isso, os reféns esquálidos aparecem em imagens vazadas pelo Hamas cavando a própria cova.

Um dos objetivos do governo de Israel ao decidir pela ocupação é entregar a Faixa de Gaza a uma administração independente do Hamas e da Autoridade Palestina. Esse é o objetivo manifesto. No entanto a destruição pode tornar a vida impossível para os 2,1 milhões de palestinos.

Nesse caso, estaríamos mais perto do sinistro sonho de Trump de fazer da região um espaço para o turismo de luxo. E mais longe da proposta da existência de dois Estados independentes. A esperança está na opinião internacional, na resiliência dos palestinos e na própria riqueza política da oposição em Israel.

Já houve manifestações de 500 mil pessoas depois da morte de seis reféns, e a História recente registra uma greve geral, pouco antes da guerra em Gaza, que obrigou Netanyahu a recuar de sua proposta para o Judiciário que ameaçava o Estado de Direito.

O problema são as próximas semanas, talvez meses. Antes de as coisas melhorarem, ainda piorarão muito, e a tragédia em Gaza é uma devastação cotidiana da sensibilidade mundial, diante de crianças famintas, reféns esquálidos e gente morrendo fuzilada na fila de distribuição de comida.

Texto e imagem reproduzidos do site: gabeira com br

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