quinta-feira, 20 de novembro de 2025

'A bancada do atraso', por Marcos Cardoso

Artigo compartilhado do site DESTAQUE NOTÍCIAS, de 19 de novembro de 2025

A bancada do atraso
Por Marcos Cardoso*

Caberá ao senador Alessandro Vieira (MDB) sacudir a poeira ideológica e tentar transformar um projeto complexo e complicado numa inédita solução de combate às facções criminosas. Ele é o todo-poderoso relator da CPMI do INSS e, agora, do projeto de lei Antifacção aprovado na Câmara. Mesmo já tendo declarado que Guilherme Derrite foi maleável, o delegado da Polícia Civil de Sergipe e senador é merecedor de confiança por parte de seus pares e considerado preparado para resolver essa missão.

O que parece não ter solução é a capacidade da bancada de deputados sergipana de sempre votar como uma igrejinha nos projetos que interessam à extrema-direita. Parece que pelo menos seis dos nossos oito deputados federais nem passam a vista nas matérias que estão votando. Só obedecem e pronto.

Vide o projeto de lei que dificulta o aborto legal à menina que tenha ficado grávida após um estupro. O que fazem pai e mãe em condições normais de afeto numa situação como essa? Claro que vão optar por retirar o feto e tentar amenizar a dor daquela pessoa frágil e necessitada de amparo, familiar e do Estado.

Os senhores políticos se ponham nesse lugar.

O Projeto de Decreto Legislativo suspende a resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) de 2024, que garante o direito de acesso à informação sobre a possibilidade de aborto da criança caso a gestação seja resultado de estupro.

Votaram sim a favor do projeto que poderá dificultar o acesso ao aborto legal dessas vítimas de violência sexual, no último dia 5 de novembro, os deputados federais sergipanos Delegada Catarina (PSD), Gustinho Ribeiro (Republicanos), Ícaro de Valmir (PL), Rodrigo Valadares (União Brasil), Thiago de Joaldo (PP) e Yandra Moura (União Brasil).

Agora os mesmos deputados aprovam, sem restrição, a sexta versão do projeto de lei Antifacção, batizado como Marco Legal do Combate ao Crime Organizado, ou PEC da Bandidagem 2.0, apresentado pelo deputado Guilherme Derrite (PP-SP). Fábio Reis (PSD) não participou das duas votações, mas os sete votaram pela anistia de Bolsonaro. Apenas o deputado João Daniel (PT) votou contra ambas proposituras.

A verdade é que a bancada de deputados sergipanos é tão medíocre que dá até saudade dos tempos que Sergipe era representado na Câmara Federal por nomes da direita como Francisco Rollemberg, Passos Porto, Celso de Carvalho, Antonio Carlos Valadares, João Machado Rollemberg, Ivan Paixão, Pedrinho Valadares, Albano Franco e José Carlos Machado. E pelos progressistas como José Carlos Teixeira, Jackson Barreto, Tertuliano Azevedo, Iran Barbosa, Rogério Carvalho, Márcio Macedo e Marcelo Déda.

PF enfraquecida

O projeto aprovado cria novos tipos penais, como o crime de Domínio Social Estruturado, com pena de 20 a 40 anos, direcionado a integrantes de organizações criminosas ultraviolentas, milícias ou grupos paramilitares. Aparentemente, foram retiradas da versão final a possibilidade de afastar a Polícia Federal da investigação das facções, de transformar o Ministério Público em mero coadjuvante da apuração e de equiparar o narcotráfico ao terrorismo.

Mas o aparente avanço perde o sentido quando foi mantido o claro propósito de enfraquecer a Política Federal. Como observou Fernando Haddad: “Como ministro da Fazenda e, portanto, responsável pela Receita Federal do Brasil, pelas aduanas brasileiras, e essas três operações que eu citei – os fundos de lavagem de dinheiro da Faria Lima, a máfia dos postos de combustível no Rio de Janeiro e a questão da fraude no sistema financeiro –, elas serão enfraquecidas com esse projeto, que, repito, asfixia financeiramente a Polícia Federal, e não o crime organizado”.

Os senhores deputados sergipanos conseguiram entender algo tão importante?

Os senadores Otto Alencar, presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, e Alessandro Vieira, relator do PL, imediatamente informaram que a Polícia Federal, o Ministério Público, a Polícia Civil e demais órgãos de segurança serão ouvidos antes de alterarem o texto do PL Antifacção. Essas instituições não foram ouvidas na Câmara.

Alessandro Vieira informou à Agência Brasil que seu relatório não permitirá que a Polícia Federal perca recursos, apesar de avaliar que o texto aprovado na Câmara está “adequado quanto ao mérito”: “Vamos verificar o formato, mas a gente já antecipa que não terá nenhum tipo de redução no financiamento da Polícia Federal, que é fundamental para o Brasil.”

Hugo Motta recebeu do governo um projeto que tinha como finalidade modernizar e fortalecer o ordenamento jurídico brasileiro, dando mais força ao Estado para reprimir as organizações criminosas que exercem controle de territórios e atividades econômicas, que foi elaborado por especialistas, tendo à frente o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, e o entregou para um policial militar de atuação no mínimo questionável.

O deputado federal Guilherme Derrite (PP), secretário de Segurança Pública de São Paulo desde a primeira hora da gestão de Tarcísio de Freitas (Republicanos) foi transferido da Rota para o Corpo de Bombeiros, em 2015, por conta da alta letalidade policial das operações que coordenava. Ele foi investigado por 16 assassinatos. Como secretário, sua gestão é marcada pela disparada na letalidade dos agentes, principalmente da Polícia Militar. O número de mortes em decorrência de intervenção policial no estado subiu de 421 em 2022 para 813 no ano passado. É o modelo que agrada aos deputados sergipanos.

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*Marcos Cardoso é jornalista. marcoscardosojornalista@gmail.com

Texto e imagem reproduzidos do site: destaquenoticias com br

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