COMBATIVO Bicudo morreu na terça-feira 31, deixando um legado inconteste
na defesa da dignidade humana (Crédito: Airam Abel)
Publicado originalmente no site da revista ISTOÉ, em 03/08/18
O devoto dos direitos humanos
O jurista Hélio Bicudo foi um intransigente defensor da
ética e das liberdades individuais, enfrentando com destemor os milicianos do
Esquadrão da Morte, durante a ditadura militar
Por Germano Oliveira
Franzino e de baixa estatura física, o jurista Hélio Bicudo,
de 96 anos, se agigantava na luta incansável pelos direitos humanos e na
vigilância de práticas de moralidade e ética na política. Como procurador de
Justiça, na década de 70, enfrentou o Esquadrão da Morte e denunciou os crimes
do regime militar sem temer as incontáveis ameaças de morte que recebeu. Em
entrevista à ISTOÉ, meses antes de morrer, Bicudo lembrou como deu início ao
combate aos integrantes da organização paramilitar, composta por policiais e
militares, no auge da ditadura militar. “Quase que diariamente apareciam
cadáveres na periferia de São Paulo com características de execução, tiros na
cabeça, corpos metralhados. Passei a investigar os casos e conclui que essas
pessoas mortas, sobretudo jovens, estavam sendo executadas por um grupo de
policiais que faziam parte do regime militar”. Entre os comandantes desses
bárbaros crimes estavam o delegado Sérgio Paranhos Fleury, apontado como
torturador de presos políticos. Fleury acabou morrendo misteriosamente afogado
em Ilhabela, no litoral de São Paulo, em 1979, antes de ser julgado.
Católico e amigo do arcebispo Dom Paulo Evaristo Arns,
falecido em dezembro de 2016, Bicudo participou ativamente da Comissão de
Justiça e Paz, fundada em 1972, dedicada a denunciar mortes, torturas e maus
tratos a presos políticos. Ajudou também a fundar o Centro Santo Dias para
socorrer vítimas da violência policial. Inconformado com a truculência cometida
contra presos, atuou na Comissão Teotônio Vilela, criada em 1983, para exigir
melhores condições nas delegacias e penitenciárias brasileiras. O seu trabalho
foi reconhecido internacionalmente e ele acabou empossado, em 2000, como
presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, com sede em Washington,
nos EUA.
“Valeu a pena defender o que era necessário ser defendido,
sobretudo aqueles que se encontravam sem defesa” Hélio Bicudo, jurista, ao
subscrever o pedido de impeachment de Dilma Rousseff em 2015
Dignidade como herança
Bicudo também deixou marcas profundas na política, onde
transformou-se em um ardoroso ativista no combate à corrupção. Embora tenha
sido um dos fundadores do PT em 1980, ao lado de Lula, foi o primeiro a
abandonar o partido quando seus dirigentes se enlamearam na corrupção do mensalão
em 2005. Dez anos depois, ao constatar que Dilma Rousseff desenvolvia um
governo que levava o País ao caos, Bicudo não pensou duas vezes e subscreveu o
seu pedido de impeachment. Ele morreu na última terça-feira 31, de problemas
cardíacos. Como herança para os sete filhos, deixou a dignidade.
Texto e imagem reproduzidos do site: istoe.com.br
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