Publicado na edição impressa
de VEJA e no Blog Fatos
Avião no ar
Por J. R. Guzzo
O Brasil da primeira classe continua brincando de democracia
americana todas as vezes que o seu submundo jurídico se agita – aquela usina
processadora de lixo onde são fabricadas, embaladas e distribuídas as leis
neste país. Você sabe do que se trata. É a combinação mortal de Câmara dos
Deputados com Senado Federal, mais o SFT, as outras “cortes superiores” e as
500 diferentes modalidades de Ministério Público que se encontra a cada esquina
– tantas que nem os próprios procuradores saberiam dizer quais são. Há ainda os
18.000 juízes. Há a OAB. Há os advogados de porta de condomínio de luxo. Há a
elite civilizada, liberal e movida a direitos, que defende qualquer aberração
carimbada como” letra da lei” – e se a letra da lei nega a aplicação da justiça
mais elementar, dane-se a justiça mais elementar. Há os “garantistas”. Há de
tudo, até quem acha uma conquista da humanidade soltar milhares de criminosos
durante o período das festas, mesmo que tenham matado pai e mãe a pauladas. É
um milagre, pensando bem, que o Brasil ainda exista. Deve ser a simpatia, o
poder do algo mais e da alegria.
O novo presidente Jair Bolsonaro já está despachando desde 1
de janeiro no Palácio do Planalto, aclamado por mais de 100 mil pessoas na
festa de posse, seus ministros começam a tomar providências práticas e nenhum
dos cataclismos que deveriam destruir o Brasil com a sua vitória, segundo nos
garantem há meses, aconteceu até agora. Mas a porção mais destrutiva da
sociedade brasileira, essa que sobrevive traficando com leis e construindo um
novo estado de direito a cada quinze dias, não dá nenhum sinal de que tenha
percebido alguma mudança no Brasil – não admite que a população quer um novo
país, pois é óbvio que se encheu definitivamente do velho. O resumo da ópera,
segundo os espíritos de primeiro mundo que querem pensar por você, é o
seguinte: esse governo que está aí não vale. Em consequência, tudo o que fizer
estará errado e será provavelmente ilegal. A ordem é: já que o “outro lado”
teve mais votos, então que se impeça o governo de governar, através da produção
contínua de baderna legal. É essa a “resistência” de que se ouve falar. O avião
já fechou as portas e decolou; é um mau negócio, para todos, ficar torcendo
para o piloto se dar mal. Mas eis aí: o que interessa para os “resistentes” é
fazer o avião cair com todo mundo dentro. Depois se vê. Pelo menos, dizem eles,
salvamos a democracia no Brasil.
A produção de desordem jurídica se faz por muitos lados, é
claro – já há gente de terno e gravata falando em impeachment de Bolsonaro, por
exemplo, ou indagando se não foi sua família que matou a vereadora Marielle.
Mas o foco principal da torcida organizada está no STF, onde a sabotagem contra
a ordem legal continua sob o disfarce de ação civilizatória em favor dos
direitos universais do homem – quer dizer, em favor de soltar Lula da cadeia.
“O STF é hoje o mais nefasto fator de instabilidade legal no Brasil”, disse
recentemente o jurista Modesto Carvalhosa. Alguém sabe de outro? Na última
brincadeira feita ali para virar a mesa, o ministro Marco Aurélio, por conta
própria, mandou que Lula fosse solto. Pura palhaçada. Dali a pouco o atual
presidente, Antonio Dias Toffoli, anulou a ordem e virou o “Anjo Bom da
Direita” – ou, talvez, um personagem daqueles programas de auditório tipo
“Rainha Por Um Dia”. Está cheio de gente assim, por lá. O ministro Luiz Fux, há
pouco, mandou prender o terrorista e quádruplo homicida italiano Cesare
Battisti – isso depois de ficar garantido que o sujeito tinha fugido, sob a
benção de um habeas corpus dado em 2017 pelo mesmíssimo Fux. Há aquele Fachin,
que um dia manda o Brasil obedecer “a ONU” e permitir a candidatura de Lula, no
outro segura na cadeia a ladroada da Lava Jato.
A próxima exibição de circo que mostrará como “estão
funcionando” as nossas “instituições” está prevista para abril – quando se fará
a centésima tentativa de tirar Lula da cadeia, agora com o julgamento final
pelo STF da questão da condenação em segunda instância. O cidadão deve ser
preso depois de condenado em duas instâncias, como ocorreu com Lula, ou só pode
ir para a cadeia se for condenado três vezes seguidas, como querem os campeões
do “direito de defesa”? Apareceu um problema, aí: para soltar Lula descobriu-se
que será preciso soltar dezenas de milhares de assassinos, estupradores e até
feminicidas, imaginem só, hoje trancados nas penitenciárias. Como é que faz? É
a entrada no mundo da insânia. Talvez seja melhor parar logo com isso.
Texto e imagem reproduzidos do Facebook/J.R. Guzzo
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