Linda Brasil: “Não teremos um mandato, e sim uma mandata!”
Atuando em movimentos sociais, principalmente nas causas
LGBTQIA+, a mestre em educação assegura que o mandato – ou melhor, a “mandata!”
-, será uma construção coletiva e participativa com questões que envolvem os
direitos humanos e educação inclusiva
Linda Brasil foi eleita vereadora de Aracaju para a próxima legislatura, de 2021 a 2024, com 5.773 votos – a mais votada da eleição municipal deste ano – e será a primeira trans assumir uma cadeira na casa. Ela, junto com mais três eleitas, irá compor a bancada feminina da câmara, onde á promete pregar a sororidade no legislativo. Atuando em movimentos sociais, principalmente nas causas LGBTQIA+, a mestre em educação assegura que o mandato – ou melhor, a “mandata!” – Será construído de forma coletiva e participativa com questões que envolvem os direitos humanos e educação inclusiva. Confira a entrevista completa que foi feita para o Jornal da Cidade:
JORNAL DA CIDADE - Conte um pouco da sua história de militância e o seu currículo.
LB – Linda Brasil Azevedo Santos, 47 anos de idade, natural
de Santa Rosa de Lima-SE. Sou Mestra em Educação pela Universidade Federal de
Sergipe (UFS), graduada em Letras Português–Francês também pela UFS,
cabeleireira e maquiadora profissional e técnica em Contabilidade. Minha
militância na causa LGBTQIA+ e, consequentemente, político- -partidária,
começou quando do meu reingresso à UFS, em 2013, para poder continuar meu curso
de Letras Português-Francês. No meu primeiro dia de aula, tive problema com um
professor por causa do meu nome social e iniciei um processo administrativo,
que acabou gerando uma portaria que regulamentou o uso do nome social dentro da
instituição. A partir deste momento passei a ter visibilidade e, por isso,
entrei no movimento estudantil organizado, comecei a participar de coletivos,
inclusive, junto com algumas amigas e alguns amigos. Fundei o coletivo Queer
(Dês) Monstadxs para discutir questões de gênero e sexualidade dentro da UFS e
em todo o Estado. Fui a primeira mulher trans a entrar em um coletivo de
mulheres organizadas na capital sergipana. Em 2014, fundei com amigas a
Associação e Movimento Sergipano de Transexuais e Travestis (Amosertrans),
entidade que ajudou muito para que a sociedade aracajuana pudesse compreender
mais sobre as questões de identidade de gênero e orientação sexual, e as pautas
que envolvem discussões de gênero e diversidade sexual. Em 2015, acabei
conhecendo mais a fundo o Psol, as ideias, e por ter me identificado muito com
a filosofia do partido e de vários parlamentares a nível nacional, acabei me
filiando. Em 2017, fundei a CasAmor, que é uma casa de acolhimento para a
população LGBTQIA+.
JC – Diante dessa experiência, como será pautada a sua atuação na Câmara? O que os aracajuanos poderão esperar da Linda Brasil como vereadora?
LB – Vou aproveitar toda a visibilidade que possuo e levar
para as pessoas informação, pois percebo que vários comportamentos hostis em
relação a nossa comunidade são por falta de um debate mais aprofundado sobre o
tema. Esse movimento de informação foi feito também durante a campanha, porque
ela não foi realizada apenas com o intuito de obter votos, mas de fazer com que
as pessoas voltassem a acreditar na política e saber que os políticos não são
iguais, como está convencionado por muita gente, que nem todo mundo exerce a
prática criminosa da compra de voto da população. Desde o ano de 2016 que as
minhas campanhas vêm sendo realizadas dentro da perspectiva da leveza, de levar
amor, alegria, de oferecer conhecimento para as pessoas fazendo um contraponto
a tudo que estamos vivendo neste momento, com tanto ódio, com discursos
montados em cima de mentiras, de fake news. Nossa proposta, desde o início, foi
diferenciada.
JC – A senhora já vem fazendo história antes mesmo de ser empossada... Então, o que pretende deixar registrado nos anais do Poder Legislativo?
LB – Projetos que sejam transformados em políticas públicas
que possam melhorar, verdadeira e efetivamente, a vida dos aracajuanos e das
aracajuanas. Quero deixar registrada uma história construída com muita verdade,
transparência, e que possa servir como estímulo a outras pessoas para que
ocupem os espaços na política, um trabalho que faça com que as pessoas voltem a
valorizar o voto e a acreditar na política partidária.
JC – Já há planejamento de projetos para serem propostos na Câmara? Quais são?
LB – A gente em um leque de projetos e propostas que foi
construído de forma coletiva, participativa. Criamos um formulário chamado “O
que você pensa para Aracaju?” para que as pessoas pudessem contribuir com os
nossos projetos. Estou comprometida com a agenda de Marielle Franco, que são as
práticas políticas que ela sempre apresentou. Projetos que ela desenvolveu
ligados à questão dos direitos humanos, da população e juventude negra da
periferia, das mulheres, da população LGBTQIA+, mas também todas as pautas
focadas numa educação inclusiva e ligadas à população mais carente de políticas
públicas, como moradia, transporte e a arte-cultura.
JC – Então, qual será a sua prioridade no mandato?
LB – Eu não terei uma prioridade, mas, sim, prioridades.
Afinal de contas, sou uma pessoa que adentrei pela minha história de vida, na
luta em defesa de algumas frentes, como a dos direitos humanos e educação. A
maioria das minhas lutas está ligada a grupos minoritários, socialmente
falando, como o LGBTQIA+, em defesa de todas as mulheres. Não teremos um
mandato, e sim uma mandata! É este o nome que estamos dando porque o meu grupo
de trabalho será composto, preferencialmente, por mulheres, por LGBTs e por
pessoas que construíram junto comigo toda esta caminhada de sucesso com um
olhar das mulheres, das LGBTQIA+’s. Porém, deixo claro que serão pessoas para
trabalhar realmente, para contribuir, para que esta seja uma mandata histórica
não apenas pelo número de votos que recebemos, mas porque fará um trabalho
inovador, revolucionário.
JC – Para a próxima legislatura, serão apenas quatro mulheres atuando na Casa. Como a senhora analisa isso? Apesar dos partidos distintos, é possível ter a sororidade?
LB – Temos um longo trabalho pela frente para que as
mulheres ocupem mais espaços de poder e liderança. Este número ainda é pequeno
tendo em vista nosso percentual na população e a nossa participação na vida
cotidiana. Espero fazer uma mandata que inspire mais mulheres, LGBTQIA+’s, a
população negra e jovens a estarem ocupando estes espaços. Atuo sempre tendo em
vista a perspectiva da sororidade. Tenho consciência da responsabilidade que
será lutarmos por políticas públicas que combatam a violência contra as
mulheres e que garanta às mulheres periféricas direitos básicos, como colocar
os filhos em creches.
Texto e imagem reproduzidos do site: jornaldacidade.net
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