Publicação compartilhada do BLOG DO ORLANDO TAMBOSI, de 22 de agoosto de 2025
Barraco bolsonarista
Mensagens confirmam frituras de governadores e articulações para submeter o país aos interesses da família. Duda Teixeira para a revista Crusoé:
As relações entre os membros da família Bolsonaro e seus amigos próximos sempre foram repletas de ameaças, gestos de ciúmes e xingamentos, intermeados por demonstrações emotivas de lealdade.
Essas atitudes tóxicas e a insistência em colocar a família em primeiro lugar afastaram aliados próximos, geraram desafetos e isolaram o clã ao longo dos anos.
A divulgação do relatório final da Polícia Federal (PF) que pediu o indiciamento de Jair e Eduardo Bolsonaro por coação no curso do processo e tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito no Supremo Tribunal Federal (STF) deverá ter o mesmo efeito.
Nas mensagens de WhatsApp e áudios divulgados pela PF, fica evidente que os Bolsonaro articularam para beneficiar a si próprios, sem se preocupar com as consequências negativas do tarifaço para a população brasileira.
Além disso, as mensagens mostram como o deputado federal Eduardo avançou contra o governador de São Paulo Tarcísio de Freitas, cotado como possível candidato nas eleições presidenciais do ano que vem.
Se antes da divulgação do relatório da PF já se notava que os governadores de direita estavam tomando uma distância segura do bolsonarismo raiz, agora eles devem ficar ainda mais à vontade para seguir um rumo distinto em 2026.
“Os governadores precisam contratar bons institutos de pesquisa e analistas eleitorais para identificar se vale a pena disputar o público bolsonarista ensandecido, correndo o risco de perder o eleitor moderado. Talvez fazer isso seja nadar contra a maré”, diz o estrategista eleitoral Roberto Reis, colunista de Crusoé.
“Podemos chegar em 2026 com o meio político chegando à seguinte conclusão: Bolsonaro é menor do que antes e seu custo é muito alto”, afirma Reis.
Ciúmes
No relatório da PF de 170 páginas ficou patente o ciúmes de Eduardo em relação ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.
Em 15 de julho, Eduardo criticou a tentativa de Tarcísio de conversar com o encarregado de negócios dos Estados Unidos, Gabriel Escobar, para evitar um tarifaço contra produtos brasileiros.
“Prezado governador Tarcísio, se você estivesse olhando para qualquer parte da nossa indústria ou comércio estaria defendendo o fim do regime de exceção que irá destruir a economia brasileira e nossas liberdades. Mas como, para você, a subserviência servil as elites é sinônimo de defender os interesses nacionais, não espero que entenda”, escreveu Eduardo nas redes sociais.
O documento da PF esta semana mostrou o que Eduardo conversou com Jair Bolsonaro por esses dias.
Em junho, Eduardo já vinha criticando o governador em mensagens para o seu pai.
“A narrativa de Tarcísio te sucedendo, que já há acordo para isto, está muito forte. Precisamos segurar isso para nos mantermos vivos aqui”, escreveu Eduardo em 25 de junho.
Eduardo, portanto, já temia que o protagonismo de Tarcísio levaria à perda de apoio à família Bolsonaro.
A preocupação é compartilhada com Carlos Bolsonaro, que no início desta semana saiu atacando os “governadores de direita”.
Carlos disse que os governadores “estão preocupados apenas com seus projetos pessoais e com o que o mercado manda”, o que seria “desumano, sujo e canalha”.
E mandou uma dura mensagem: “A verdade é dura: todos vocês se comportam como ratos, sacrificam o povo pelo poder e não são em nada diferentes dos petistas que dizem combater”. Eduardo, o irmão, compartilhou a publicação.
Encarregado de negócios
Quando Tarcísio se reuniu com Gabriel Escobar, em 11 de julho, o filho Eduardo fez questão de deixar claro ao pai que só ele próprio poderia ajudá-lo, negociando com os americanos diretamente dos Estados Unidos.
"Se [Tarcísio] quiser acessar a Casa Branca ele não conseguirá", escreveu Eduardo. "Só eu e Paulo Figueiredo temos acesso."
“Só para te deixar ciente: Tarcísio nunca te ajudou em nada no STF. Sempre esteve de braço cruzado vendo vc se fuder e se aquecendo para 2026”, escreveu Eduardo.
"Agora ele [Tarcísio] quer posar de salvador da pátria. Se o sistema enxergar no Tarcísio uma possibilidade de solução, eles não vão fazer o que estão pressionados a fazer. E pode ter certeza, uma 'solução Tarcísio' passa longe de resolver o problema, vai apenas resolver a vida do pessoal da Faria Lima", escreveu Eduardo.
Ingrato
Em 15 de julho, Jair Bolsonaro deu uma entrevista ao site Poder360, dizendo que atuou para “botar uma pedra em cima” das disputas entre Eduardo e Tarcísio.
“O Tarcísio é governador de um estado, ele não é presidente da República. Ele tem que estar vendo o empresariado lá de São Paulo, que por tabela é todo mundo. No meu entender ele está fazendo o possível. Vai conseguir? Não sei. Porque essas decisões são pessoais do presidente Trump. (…) Ele [Eduardo Bolsonaro] apesar de ter feito 40 anos de idade agora, né… ele não é tão maduro assim, vamos assim dizer, talhado para a política… tá bem. Ele acerta 90% das vezes, 9% quando meio e 1% está errando”, disse Jair Bolsonaro na entrevista.
Eduardo demonstrou irritação com o pai e chegou a xingá-lo.
“Eu ia deixar de lado o histórico do Tarcísio, mas graças aos elogios que vc fez a mim no Poder360 estou pensando seriamente em dar mais uma porrada nele, para ver se vc aprender. VTNC SEU INGRATO DO C*!”, escreveu Eduardo.
“Me fudendo aqui! Vc ainda te ajuda a se fuder aí! Se o IMATURO do seu filho de 40 anos não puder encontrar com os caras aqui, PORQUE VC ME JOGA PARA BAIXO, quem vai se f* é vc E VAI DECRETAR O RESTO DA MINHA VIDA NESTA PORRA AQUI! TENHA RESPONSABILIDADE.”
“Anistia light”
Eduardo não apenas mostra que desejava a benção do pai para ele próprio se candidatar à Presidência, como entendia que somente poderia haver um apaziguamento com os Estados Unidos caso seu pai fosse poupado pelo STF.
E Jair Bolsonaro concordava com o filho, tanto que no dia 13 de julho enviou a seguinte mensagem ao pastor Silas Malafaia: “O que eu mais tenho feito é conversar com pessoas mais acertadas, vamos assim dizer, no tocante, que se não começar votando a anistia, não tem negociação sobre tarifa. Não adianta um ou outro governador querer ir para os Estados Unidos, ir para embaixada, para não sei onde quer que ele vá, tentar sensibilizar. Não vai conseguir. Da minha parte, é por aí, pô”.
Não é segredo para ninguém que, quando os bolsonaristas falam em anistia para os condenados no 8 de janeiro, o que estão procurando é uma maneira de livrar Jair Bolsonaro.
O relatório da PF também descortina esse ponto, quando Eduardo usa o termo “anistia light”, que poderia ser interpretado como uma anistia que não inclui o ex-presidente.
“Se a anistia light passar [no Congresso], a última ajuda vinda dos EUA terá sido o post do [Donald] Trump. Eles não irão mais ajudar. (…) Temos que decidir entre ajudar o Brasil, brecar o STF e resgatar a democracia OU enviar o pessoal que esteve num protesto que evoluiu para uma baderna para casa num semiaberto”, escreveu Eduardo.
Ajudar a reduzir a pena dos condenados no 8 de janeiro, assim, seria contrariar os planos da família.
Julgamento
Os governadores reagiram aos ataques de Eduardo e de Carlos com serenidade, dizendo que entendem o desespero da família a e até se solidarizam com ela, mas não responderam as agressões, nem prometeram qualquer coisa.
Tarcísio, na quinta, 21, evitou entrar no barraco bolsonarista.
“Primeiro eu não vou comentar, é uma conversa privada de pai para filho, é uma questão que só interessa aos dois e eu não sei nem porque essas conversas foram divulgadas, realmente não vejo interesse público nisso”, disse o governador durante agenda na região de Marília, no interior do estado.
“Segundo, a minha relação com o Bolsonaro vai ser como sempre foi, relação de lealdade, relação de amizade, relação de gratidão com uma pessoa que eu entendo fez muito pelo Brasil, fez muito por mim, me abriu a porta, sempre foi muito amigo e eu vou ser amigo, vou estar sempre do lado, vou estar sempre trabalhando para ajudar na medida do possível”, acrescentou.
Filhos x governadores
A disparidade no comportamento dos governadores e dos filhos de Bolsonaro se explica porque, enquanto a família se aflige vendo seu capital político diminuir, os governadores fazem calmamente seus planos para o futuro.
“O poder de comando de Jair Bolsonaro encolheu. Quando estava no Planalto, Bolsonaro atraía governadores pela força da máquina federal. Hoje, com processos e prisão domiciliar, ele perdeu a autoridade que antes impunha obediência”, diz o estrategista eleitoral Wilson Pedroso, sócio da Real Time Big Data e novo colunista de Crusoé.
“O que sobrou para os Bolsonaro foi capacidade de mobilização. O clã ainda faz barulho e cria custos para quem desafia, mas é uma força reativa, não de liderança. Governadores já calculam melhor o risco de se associar, porque Bolsonaro não entrega benefícios e ainda carrega alto desgaste judicial”, diz Pedroso.
Indulto ou anistia
A esperança dos Bolsonaro era de que os governadores estariam com a família até o final, elevando o tom de suas declarações contra o STF e questionando a legitimidade das eleições sem Jair Bolsonaro.
Na mente dos Bolsonaro, os governadores ainda estariam em uma disputa entre si, agradando ao máximo o ex-presidente para, ao final, conseguir sua indicação para concorrer à Presidência.
Em vez disso, os governadores têm demonstrado unidade entre eles. Falam em “projeto político da direita” e consideram que todos ali são legítimos pré-candidatos desse campo político.
Eles também têm sido cautelosos ao falar do Judiciário. “Os Bolsonaro estão pedindo algo que é impossível. Eles querem que os governadores se indisponham com o STF e com as outras instituições. O que a família quer é uma declaração de guerra, e isso os governadores não podem fazer”, diz o cientista político Leonardo Barreto, colunista de Crusoé.
Além de ser impossível agradar ao clã, os governadores fazem a conta de que, uma hora ou outra, Jair Bolsonaro será obrigado a dar seu apoio político a um pré-candidato da direita, provavelmente um governador.
A condenação de Bolsonaro na trama golpista é dada como certa, e ele precisa ter, ao menos, a garantia de que o próximo presidente lhe prometeu anistia ou indulto, para cobrar isso depois, em 2027.
Se o indicado de Bolsonaro não for o vencedor das eleições do ano que vem, não haverá como solicitar um perdão no futuro.
Bolsonaro, assim, precisa escolher um candidato com boas chances, o que praticamente elimina a chance de seu filho Eduardo Bolsonaro, que agora poderá ser denunciado pela Procuradoria-Geral da República.
Contra o Brasil
Pesquisa Genial/Quaest divulgada na quarta, 20, mostrou que os brasileiros têm visto de maneira muito negativa a atuação de Eduardo nos Estados Unidos.
Para 69% dos entrevistados, Eduardo defende os interesses próprios dele e da família Bolsonaro. Somente 23% acham que ele defende os interesses do Brasil.
Eduardo vai mal entre os brasileiros que não têm posicionamento político, o grupo que costuma decidir o resultado das eleições. Entre eles, 78% acham que Eduardo só pensa na família, e não no país.
A família ainda mantém um eleitorado fiel, em torno de 15% a 20% do eleitorado, mas aproximar-se demais de seus membros pode ser fatal na eleição do ano que vem, e isso os governadores preferem evitar.
“O clã mantém peso eleitoral e capacidade de veto, mas já não dita os rumos da direita”, afirma Wilson Pedroso.
Os governadores, assim, podem seguir tranquilos.
O tempo está a favor deles e contra a família Bolsonaro.
Texto e imagem reproduzidos do blog: otambosi blogspot com
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