Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
Publicado originariamente no site NE NOTÍCIAS, em 13 de setembro de 2019
Ilusões perdidas
Por Alessandro Vieira*
O país está atordoado em meio à descrença na capacidade do
presidente da República de se comportar à altura dos desafios nacionais e ao
trauma do impeachment recente. Emprego, saúde e educação não viram avanço
significativo. As reformas estruturais estão sendo feitas, apesar da
inadequação do discurso presidencial, graças ao parlamentarismo branco que se
impôs. Entretanto, nem o mais forte sentimento de medo de mudança consegue se
sobrepor à frustração de se sentir enganado.
Os 57 milhões que foram às urnas votar em Jair Bolsonaro no
segundo turno da eleição de 2018 acreditaram nas promessas de combate à
corrupção, de dar fim aos privilégios, ao nepotismo. O lema era “Brasil acima
de tudo”. Em 1º de janeiro, quando o presidente tomou posse, essas já eram
palavras vazias. Perderam o sentido cedo, em 6 de dezembro de 2018, dia em que
os brasileiros souberam que um certo Fabrício José Carlos de Queiroz,
ex-assessor e ex-motorista de Flávio Bolsonaro, movimentou em conta o total de
R$ 1.236.838,00. O hoje extinto Coaf considerou as operações suspeitas.
Desde então, somos obrigados a conviver com uma forma de
governar bastante distinta daquela prometida na campanha eleitoral.
Instituições como a Receita Federal, a Polícia Federal e o próprio Coaf, que
sobreviveram aos anos do mensalão e do petrolão, vêm sendo capturadas. O
aparelhamento da Procuradoria-Geral da República, rompendo a tradição da lista
tríplice, é o ponto mais recente do desmonte institucional, colocando em risco
a garantia de que poderosos não estão acima da lei.
O hoje ministro Sergio Moro, referência internacional de
combate à corrupção, passa por um processo ostensivo de desmoralização, bancado
por insólita aliança entre novos e velhos investigados. Assistimos, assim, à
morte do projeto de combate à corrupção, a causa que moveu os eleitores de Jair
Bolsonaro no segundo turno. Estou entre eles.
A investigação do caso Queiroz tem oito meses e deveria ser
simples. Trata de dinheiro nas mãos do ex-motorista de Flávio Bolsonaro,
funcionários fantasmas, depósitos fracionados em espécie para o atual senador e
cheques que somam R$ 24 mil para Michelle Bolsonaro. A paralisação dessas apurações, além de expor
de forma inequívoca um acordão firmado em Brasília, aponta, também, para a
tentativa de erodir as instituições que permitiram que Lava-Jato e outras
investigações do seu porte pudessem existir. É a desconstrução do sonho de um
Brasil justo e ético.
Não podemos tolerar a volta ao Brasil das gavetas, dos
favores, das indicações políticas, do desrespeito às regras. As consequências
desastrosas neste governo já são visíveis. Estão no preço do dólar, nas
relações exteriores, no meio ambiente, na economia, na educação e na saúde.
Para estes tantos problemas há esperança de recuperação. Mas é preciso desfazer
ilusões: o presidente da República não está comprometido com o combate à
corrupção. É ele próprio o maior entrave a essa tarefa da qual não podemos
abdicar.
*Alessandro Vieira é senador (Cidadania-SE)
Texto e imagem reproduzidos do site: nenoticias.com.br
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