Foto reproduzida da revista Veja
Texto publicado originalmente no site da revista Veja, em
17/11/2018
Resistentes
Por J.R. Guzzo (Colunista da revista Veja)
Depois do período das
eleições, enfim resolvidas com a vitória de Jair Bolsonaro, vivemos agora o
momento seguinte do calendário político como ele é entendido pelos que perderam
— o período de resistência ao resultado das eleições. Atenção: não se trata simplesmente
de fazer oposição. Trata-se de anunciar ao Brasil que os derrotados não aceitam
o resultado estabelecido pelos eleitores; não valeu, dizem eles, porque só a
gente tinha o direito de ganhar. A palavra “resistência” soa bonito, como em
filme americano de guerra, mas naturalmente não é nada disso. Levando-se em
conta a qualidade da oposição política atual, o que vem à cabeça na hora,
quando a palavra “resistência” é utilizada pelo PT, é resistência de chuveiro
elétrico ou de chapa para fazer tostex — pois não dá para ninguém pensar a
sério, realmente, que o Sistema Lula-PT-Esquerda vá resistir a alguma coisa
gritando “Bom dia, presidente Lula”, na frente da cadeia de Curitiba, ou
negando-se por “tradição democrática” a cumprimentar o candidato que a
população elegeu. Mais ainda, surgem suspeitas de pane nos circuitos mentais do
PT quando o partido entra na Justiça com um pedido de “anulação das eleições”,
ou exige do STF a libertação imediata de Lula porque o juiz Sergio Moro foi
escolhido como futuro ministro da Justiça de Bolsonaro. Isso não é resistir.
Isso não é nada.
A soma de todos esses esforços que pretendem contestar o
novo governo se resume ao seguinte: continuar defendendo tudo o que a maioria
do eleitorado acaba de condenar com o seu voto, e dobrar os ataques contra tudo
o que o eleitorado acaba de dizer que aprova. É uma coisa extraordinária. A
maioria dos brasileiros decidiu, de uma maneira talvez mais clara que em
qualquer outra ocasião na história recente do país, o que quer e, principalmente,
o que não quer. A “resistência” vai na direção exatamente oposta. É como se não
tivesse acontecido nada em 28 de outubro de 2018 — ou, mais ainda, é como se
Bolsonaro tivesse perdido as eleições e o PT tivesse ganhado. O resultado é o
que aparece todo dia no noticiário: uma coleção de alucinações, que a imprensa
quer desesperadamente que você leve a sério, apresentadas como se fossem ações
de combate contra o “avanço do fascismo” etc. etc. Que ações? Que combate? Vai
saber. Qualquer coisa serve.
Temos, assim, jornalistas da Rede Globo defendendo a ideia
de que a polícia não deve ser autorizada a atirar num sujeito que está no meio
da rua com um fuzil automático na mão. Seu argumento: como se vai provar que
essa pessoa está realmente com más intenções? E se ela não quer atirar em
ninguém? E se o fuzil não for um fuzil, e sim um guarda-chuva? À primeira
vista, parece que alguma coisa deu errado — que diabo essas moças estão
falando? Mas não: é isso mesmo. No ato seguinte, aparece uma especialista-técnica
em “políticas públicas de segurança”, ou algo assim, e nos informa que os
bandidos têm o direito de carregar fuzis para se defender da polícia e
garantir, com isso, a sua legítima defesa. Na mesma emissora, uma apresentadora
subiu um degrau a mais no “nível de lutas”, como se diz, e falou na necessidade
de sabotagem. “Vamos sabotar as engrenagens deste sistema de opressão”, pregou
ela no ar. “Vamos sabotar este sistema homofóbico, racista, patriarcal,
machista e misógino” — palavra hoje na moda, essa última, que metade do público
não sabe o que significa. O exame do Enem, uma semana depois da eleição, fazia
uma pergunta sobre a linguagem privada dos travestis e suas raízes no idioma
iorubá. Educadores apresentados como “antifascistas” comemoraram a inclusão da
pergunta como uma importante derrota da direita conservadora e do novo “governo
autoritário”.
Na mesma batalha para ficar no lado contrário ao do eleitor,
o PT acha inaceitável que Moro tenha sido convidado para ministro da Justiça —
uma prova, segundo a alta direção petista, de que a condenação de Lula foi uma
“jogada” com Bolsonaro. De todos os problemas com essa ideia, o pior é que mais
de 80% da população aprovou a ida de Moro para o novo governo. Não é só o PT
que está na “resistência”. A ministra Cármen Lúcia, depois de embolsar mais um
aumento abusivo no próprio salário, lamentou a mudança “perigosamente
conservadora” na situação política. Fernando Henrique, no exterior, faz
campanha contra o novo governo — e por aí vamos. É a tal “superioridade moral”
que os derrotados atribuem a si próprios. O que todos eles estão dizendo, na
prática, é que o povo brasileiro, mais uma vez, votou errado.
Texto reproduzido do Facebook/J. R. GUZZO
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